Análise Death and Taxes

Death and Taxes é um ótimo exemplo para a máxima “não julgar um livro pela capa”. Neste caso, não julgar pelo título. É que este intrincado puzzle narrativo, desenvolvido e distribuído pela Placeholder Gamerworks, lança-nos uma premissa simples – tomar o papel do Grim Reaper e selecionar quem vive e quem morre – para, durante a hora e meia, duas horas que cada run pode tomar, nos subverter as expectativas. Mas vamos por partes.

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Quem diria que a morte poderia ser tão divertida?

Ou vive, ou morre. Ponto final.

O cerne de Death and Taxes é, na verdade, facilmente explicado. A nossa personagem é criada por Mr.Fate, uma figura misteriosa que se apresenta enquanto nosso… “Chefe” de departamento, para ocuparmos o lugar vago enquanto Grim Reaper. Ao contrário do que a mitologia da figura poderia sugerir, este não é um jogo de ação, não temos uma foice nem perseguimos pessoas. É, sim, um trabalho de secretária. Literalmente. A jogabilidade acontece numa secretária, onde diariamente recebemos relatórios sobre seres humanos para que, com um marcador, possamos decidir quem vive, quem morre.

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O nosso trabalho é orientado por Mr. Fate, através duma carta que nos passa os objetivos que devemos cumprir, em determinado dia, para manter o equilíbrio no mundo dos humanos. Estes passam entre diretrizes simples, como matar dois humanos, até lógicas bem mais vagas, como deixar apenas o humano “certo” vivo.

De todas as vezes que cumprirmos o que nos é pedido, recebemos o equivalente às decisões em dinheiro, que podemos depois utilizar na loja, para adquirir roupas e faces novas, bem como objetos que nos ajudam a perceber um pouco mais Death and Taxes.

Este ciclo é interrompido no final de cada dia, ao termos que falar com Mr.Fate para fazermos o relatório diário das nossas ações e, muitas vezes, conversar sobre a função e… sobre o sentido da vida. É aqui que o título da Placeholder Gamerworks levanta um pouco o capuz e nos mostra que é bem mais do que a mera repetição de passos burocráticos.

Nem tudo o que parece, é.

Death and Taxes utiliza a sua narrativa para nos dar algumas pistas sobre as suas mecânicas. Nas conversas com Mr.Fate e, por vezes, com umas nuvens suspeitas que surgem no nosso quarto, percebemos que existe um equilíbrio pelo qual, ao contrário do que o jogo nos leva a crer, somos diretamente responsáveis. Temos várias seleções de diálogos que nos poderão levar a vários finais de jogo diferentes, todos eles assentes na forma como tratámos o Mundo no fim de cada sessão.

Estes diálogos, embora divertidos ao início, cedo demonstram uma reflexão altamente filosófica, que nos coloca noutro estado de espírito durante o jogo. Na verdade, o que é morrer? Porque é que somos nós a ter o controlo dos destinos dos humanos? Se alguém decide quem é que morre e quando, existirá mesmo livre-arbítrio? Estes temas ajudam-nos a refletir sobre o ato de morrer, ao mesmo tempo que acrescentam um valor moral e pessoal cada vez mais pesado nas tomadas de decisões.

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Isto porque cada humano corresponde a quatro atributos escondidos, que apenas descobrimos com o adquirir de objetos na loja de Mortimer, um simpático esqueleto pirata, como um candeeiro que nos demonstra as alterações que cada vida ou morte tem, para determinado atributo, ou um globo de neve que nos permite olhar para o Mundo e para a ruína – ou fortuna – que lhe trazemos.

Repetir até à exaustão?

As conversas e reflexões que temos com Mr.Fate, aliadas aos objetivos que precisamos de cumprir, levam-nos a ter a falsa ideia de que precisamos de os seguir à risca. Death and Taxes, no entanto, permite-nos perceber, através das suas várias playthroughs, que existem outras opções. Ao nunca ser explicado, levam-nos a sentir na pele as consequências dos nossos atos, obrigando o jogador a refletir sobre as decisões certas vs as ordens hierárquicas.

Neste jogo do que é certo e do que é pedido, estão assentes os relatórios sobre os seres humanos, que nos descrevem a sua idade, a sua vida, e as suas profissões. E se algum reparo se poderá fazer a Death and Taxes, é na pouca clareza que cada decisão singular pode ter. É que os textos, por muito interessantes e variados, nem sempre nos comunicam, exatamente, qual a melhor decisão para cada atributo.

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Para além disso, os vários finais alternativos vivem bastante da compreensão exata da alteração destes valores escondidos em cada decisão, pelo que para jogadores com maior apetência para alcançar os 100%, sem um guia, poderá ser muito complicado e até frustrante ver tudo o que Death and Taxes tem para nós.

Considerações Finais

Porém, não deixem que isto vos impeça de experimentar Death and Taxes: a arte, desenvolvida pela artista Leene Künnap, produz um efeito aguarela que mais impacto traz ao produto final – muitas vezes, sentimos que estamos a percorrer as folhas de uma BD mais alternativa, com pormenores deliciosos na caracterização de cada personagem.

A música também salta entre um jazz mais melancólico e electro-swing mais mexido, porém, fruto da experiência burocrática que o título da Placeholder Gamerworks nos tenta passar, os cenários são muito parcos na variedade, o que não ajuda de todo a manter o interesse para subsequentes sessões de jogo.

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No fim do dia, este é mais uma excelente proposta da cada vez mais importante escola báltica de videojogos, capaz de nos comunicar várias premissas através da jogabilidade repetitiva e, até, monótona, inspirada em ações do mundo real. Falta-lhe alguma clareza no real impacto de cada mecânica para o tornar absolutamente obrigatório, mas também… é este mistério que acaba por dar charme a Death and Taxes.

Apesar de pouco claro em momentos, Death and Taxes leva-nos a uma reflexão muito interessante sobre o que é ser-se humano e se, realmente, temos livre arbítrio ou não. A escrita irrepreensível e as várias opções tornam-no um título que merece a vossa atenção.

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+ Narrativa impressionante, pela qualidade da escrita e exposição de temáticas;

+ Direção artística apelativa e criativa;

+ Vários finais alternativos, contribuindo para uma longevidade mais alta que o esperado;

– Pouca clareza no impacto de cada atributo;

– Pouca variedade de cenários;

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N.R.: A análise a Death and Taxes foi realizada numa Nintendo Switch com acesso a uma cópia do jogo, gentilmente disponibilizada pela Pineapple Works

Carlos Duarte: Adulto de 30 e poucos anos que guarda, dentro de si, o garoto que se apaixonou por videojogos e por um ouriço azul. Escriba profissional de assuntos diversos, jogador dedicado da 1ª à 9º geração de videojogos.
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