Serial Cleaners

Serial Cleaners – Análise

A análise de hoje a esta sequela (Serial Cleaners) do original de 2017 da Draw Distance e Curve Games tem o formato de diálogo. Resulta de conversas ocasionais de dois pais cansados, em que aqui o vosso escriba pede comentários sobre o jogo à sua companheira Carla, que não percebe o fascínio dos videojogos num homem adulto, enquanto ele a coage a vê-lo jogar no meio de sonoros “hum…” de aborrecimento.

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A Carla odeia situações inverosímeis, é pragmática e não perdoa falhas nas mecânicas ou argumentos. Já eu sou um sonhador que esquece, que ri e que chora com videojogos, filmes, séries, músicas e contemplações do céu azul. Isto tem tudo para correr bem.

“Quero um aspirador daqueles!” – Carla

Paulo – Vamos a isto. O jogo chama-se Serial Cleaners…

Carla – Ah, que engraçado, trocadilho com “serial killers”. Original.

Paulo – Calma. Terás muito tempo para desancar tudo isto. Mas o título até tem piada, vais ver. Há um grupo que limpa cenas de crime e que é contratado por malta menos recomendável. O líder é o Bob, que pelos vistos já aparecia na primeira iteração do jogo. Agora temos ainda o passadinho da cabeça Hal, a menina dos computadores Erin e Lati, que está em período probatório a ver se isto é vida para ela. Que estás a achar do estilo da arte? Tem vibrações de anos oitenta, não achas? Eles vão contando as suas aventuras e nós vamos ter que as realizar, como se se unissem à volta da fogueira, recordando outros tempos.

Carla – (olhando para o telemóvel) Caraças, o gasóleo vai subir outra vez. Hum? Ah sim, vão usar flashbacks, é isso? Usei uma palavra, gaiato, uma.

Paulo – Ainda não se pagam, deixa-me usá-las.

Carla – Vá, vamos, primeira missão. Daqui a bocado a miúda acorda e esta tua ideia “brilhante” apaga-se.

(Trinta minutos passam, sem qualquer palavra)

Paulo – Percebeste a mecânica? Não deve fugir muito disto. Há um crime, há sangue, provas, corpos por todo o lado. Temos que nos livrar deles, quase sempre evitando polícias, detetives, outros criminosos…

Carla – Se tens mais que um colaborador de limpeza, podes escolher quem vai?

Paulo – Não. Por vezes podes chamar outro para te dar uma ajuda, mas assim não consegues escolher o que melhores características tem para fazer um melhor trabalho. Pena. Há quem desmembre corpos com motosserra, os guarde em armários, outros usam distrações como grafittis, andam pelas ventilações, enrolam os corpos em panos…

Carla – OK. Que jogo fofo para se jogar à meia noite de um dia de semana. Mas explica-me lá uma coisa…

Paulo – Ui, problemas.

Carla – (esboçando um esgar de escárnio e alegria) Então aquelas quantidades enormes de sangue são retiradas por um aspirador? Quero um aspirador daqueles! E onde estava guardado? Alguma bolsa mágica cheia de material? E aspira a neve? Dyson, já foste! Outra coisa: Já reparaste que o percurso dos polícias é sempre o mesmo? Há bocado deixaste ali um corpo, deste uma pancada com um braço num mau da fita (abre os olhos em total descrédito), ele levantou-se… E seguiu a vida como se nada tivesse acontecido. A tua pancada deu-lhe amnésia, foi?

Paulo – Tens razão. Para um jogo que se apresenta tão verosímil, obriga-nos depois a recuar e a não o levar tão a sério. Imersão e realismo é na série Hitman, não aqui.

“ A música jazz é para quê? Não te mexes há quatro minutos!” – Carla

Paulo – Reparaste? Tentei algo diferente para acabar o mesmo nível, mas não resultou. A fórmula para concluir com sucesso cada nível parece ser sempre a mesma… Esconder os corpos, lirvarmo-nos das provas e dos membros, aspirar uma certa quantidade de sangue com o nosso super aspirador… E bazar. Um bocado seca, não achas? O desafio aqui é tentar encaixar as peças temporais das rotinas que cada interveniente tem. Depois de decorarmos isso, há pouca surpresa, desde que façamos as coisas com cuidado. Às vezes um passo a mais faz com que o alerta geral ecoe pela área do nível.

Carla – Pois, chatinho, não? Tudo parece acontecer muito devagarinho. Menos mal; há bocado foste apanhado e recomeçaste onde tinhas deixado o último corpo. Se começasses de novo, ia-me deitar. 

(Quatro minutos de silêncio ensurdecedor, enquanto se coça)

Carla – A música jazz é para quê? Não te mexes há quatro minutos!

Paulo – Tenho que esperar que todas as peças se encaixem nestas engrenagens com perfeição, senão não vai resultar. Ainda bem que tenho este “Cleaner Sense” ao alcance de um botão, para podermos ver elementos e guardas que desconhecíamos, facilita muito… Eh, então? Este guarda saiu de onde? Não o vi!

Carla – Ah! O teu sexto sentido virtual falhou-te. Bem te digo que isso é uma coisa que não pode ser replicada. É exclusivo das mulheres…

Paulo – Xi, isto frustra. Estava a olhar para aqueles que conhecia e um terceiro tramou-me. Já para não falar que não dá para ver ninguém entre escadas, o perigo está sempre lá porque não conseguimos vislumbrar.

Carla – Outra vez a música… Não dá para a tirares?

“Tens ali poucos livros para leres!” – Carla

Paulo – E no que diz respeito à estória em si das personagens? O que achaste? Cada um tem as suas próprias razões para entrar neste mundo e isso está bem explorado. Esta vida do crime não tem todo o  interesse e diversão que algumas das personagens mostram quando as conhecemos. São moldadas pelo que vai acontecendo. E ainda bem que assim é.

Carla – Verdade. Pouco me iam interessar os clichés cinematográficos do louco, da geek e do velho lobo solitário. Ao acrescentarem-lhe camadas de personalidade, ao menos faz com que o jogador se importe alguma coisa com aqueles desviados da sociedade. Única razão pela qual me interessam.

Paulo – Eh lá! Já escreves analises de videojogos há muito tempo? Boas tiradas, Carla Isabel!

Carla – É nisto que perdes horas? Jogos de mecânicas ruins? Se te queres relacionar com estórias, podes ler um livro. Tens ali poucos livros para leres!

Considerações finais

Tiradas da Carla à parte, Serial Cleaners deixa rastos de problemas em cada um dos seus níveis variados, mas de mecânicas semelhantes. Mesmo quando somos perseguidos pelos agentes da lei, a música nunca muda daquele jazz de elevador, que não contribui para a escalada de emoção que se exigia de uma situação destas. A IA não ajuda, pois é mesmo muito tonta, esquecendo-se dos nossos atos anteriores. Os níveis acabam por se tornar entediantes, pois temos que esperar longos períodos de tempo até que todos as partes intervenientes estejam colocadas no sítio exato para nos podermos movimentar e por o plano em ação. Não premeia a experimentação e risca dos objetivos a repetibilidade.

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No entanto, tem rasgos de positividade em vermelho carmim: é bem escrito, com um design que lembra outros tempos. Não será o jogo de stealth mais imersivo, mas quem aprecia o género, tem aqui diversão para algumas horas. A Carla não gostou.

nota 3
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 Serial Cleaners não apaga o rasto do tédio que o contorna e relembra que esperar é uma virtude que nem todos têm.


+ Boa escrita
+ Arte icónica

– Pouco imersivo
– Esperar, esperar, esperar
– Não entusiasma

N.R.: A análise a foi realizada numa PlayStation 5 com uma cópia do jogo cedida pela Alfred PR. E com o contributo inequívoco da minha companheira Carla.