Shin Megami Tensei V – Análise

Sou apenas mais um simples estudante em Tóquio, com poucos amigos e com uma estranheza de ser. Mas tudo o que sou mudou depois de um terramoto que me enviou para Da’at, uma pavorosa e incompreensível versão da cidade onde me fiz gente.

Herdei poderes especiais que desenvolvo a pouco e pouco, e vejo-me envolvido numa guerra que não era minha, entre seres que desconhecia serem reais. Tudo o que os humanos eram, todo o seu poder e domínio despareceu. Somos poucos e vejo-me forçado a fazer alianças que têm tanto de fortuito como de nojento.

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Será este o fim do mundo, tantas vezes anunciado? Terá esta luta críptica um lugar para mim numa nova ordem mundial? Sejam meus companheiros. Preciso deitar cá para fora tudo o que aconteceu. E não foi pouco. 

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No negociar está o ganho

Enfrentar uma aventura magnânime como esta não foi feita para se guerrear a solo. Porém, é assim que ela começa. E é aqui que começa o meu pacto com as criaturas que abomino. Há que manter os inimigos mais perto do que os amigos. Tenho sempre comigo três monstros que me acompanham em todas as batalhas, pelo menos até que eles me sejam úteis. Haverá sempre um montro mais forte, com menos fraquezas, com truques especiais que posso colocar debaixo da minha manga. Este manusear de diferentes monstros com diversas capacidades e defeitos faz com que a minha estratégia tenha que ser bem planeada e este lado de customização é algo que me agrada.

Mas até que se tornem meus servos de guerra há que estabelecer diálogos com eles. E quanta bizarria, quanta estranheza se encontra na génese diferenciada de cada um deles. Uns só aceitam ficar ao meu lado depois de os ofender, outro pedem-me recursos, seja dinheiro ou até parte da minha vida, outros até brincam comigo, pois ao chegarmos a acordo, desaparecem sem deixar rasto. A subjetividade de alguns diálogos mordazes e ofensivos não me deixam satisfeito, pois ficamos com a impressão de ter feito tudo para que fique do nosso lado e isso acaba por não acontecer. Mas estas conversas estranhas são um aspeto muto positivo desta minha caminhada, pois estes mostrengos acabam por ser a minha companhia nesta caminhada infernal. Negociar sem lógica é divertido.

Posso sempre melhorar os monstros que tenho, fundindo dois que já não me façam falta e que permitam obter um novo bem mais poderoso que os seus pais, por quem dão a vida num processo que envolve uma cerimónia onde acabo por tocar um órgão. Mais uma das minhas virtudes.

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Posso ainda continuar a melhorar alguns das criaturas diabólicas que encontrei, estando ainda ao meu lado e sendo fiéis companheiros de batalha em quem nunca confiarei inteiramente. Usando até um sistema que me transforma num professor de habilidades, ensino truques de ogres para ogres, ficando cada vez mais perto de formar os comparsas mais fortes e com menos fragilidades. Há que experimentar e por vezes o erro nesta criação da equipa perfeita é o perfeito aliado para atingir a perfeição que nunca chegará.

Se essa perfeição para cada área do mapa, para cada inimigo de fim de capítulo não for encontrada… Será facilmente o meu fim. Esta Tóquio apocalíptica não vai facilitar em nada o meu caminho que se pressente sangrento. Esperemos que eles sangrem mais do que eu, pois deles nunca terei misericórdia.

Luta. Mata. Luta. Mata. Evolui.

A matança de monstros, deuses e diabos faz parte da minha longa caminhada até ao centro de tudo. Há que persistir, insistir para evoluir. O que torna o meu progresso algo tedioso, pois a mesma zona está sempre infestada dos mesmos grupos de inimigos. A minha progressão faz-se devagar, mas eu sou paciente.

Por vezes aparece um inimigo que pode acelerar os meus niveis de crescimento, pois acertar-lhe com o ataque certo pode fazer com que sinta uma evolução de até um nível apenas num encontro. Como disse, estes encontros são raros e cheios de fortuna ou azar; nunca se sabe o que vai resultar contra este específico inimigo, não é possível de auscultar as suas fraquezas de forma alguma e um único ataque errado faz com que ele desapareça da batalha, empunhando em seu esgar um sorriso trocista. Miserável monstro. Hum. Não o posso combater e não o posso evitar, se quero ser considerado digno de deslindar toda esta charada até ao fim. Os desafios são constantes e estes desertos demasiado traiçoeiros para alguém incauto. Estão avisados.

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Mas não é aqui que sempre me encontro, neste calor infernal de uma Tóquio dizimada. Por vezes a minha mente obriga-me a vaguear por uma cidade nipónica que mais não existe. Quando tudo era normal, quando tinha amigos, quando frequentava uma escola, quando era feliz de uma forma normal e monótona. São momentos que não aprecio. Sinto-me um peão literal em que não tenho nada para fazer, a não ser para ouvir as lamúrias ridículas de pessoas que já não o são.

Anseio pelo fim de cada capítulo da minha caminhada, onde sou brindado com fortalezas cheios de inimigos para eviscerar. O nível de dificuldade destes confrontos cresce de forma por vezes desmesurada, e luto muito para me manter à tona. Estes confrontos têm também alguns puzzles que não o são realmente e acabam por me aborrecer de morte. Obrigam-me a recuar e novas hordes dos mesmíssimos bichos perseguem-me.

O que não se conta, ou o que não há para contar

A forma como tudo se desenrolou é maçadora. Já bem dentro da minha demanda como Nabohino, foi por vezes difícil encontrar motivação para continuar, pois o simples desígnio de sobreviver pareceu-me sempre simplista, digno das bestas que destruo, não de uma estória que será recordada como magnânima. Também os meus efémeros companheiros humanos não se apresentam e não se dão a conhecer, como se fizessem parte de um argumento secundário, sem qualquer importância. O tempo que passo com eles é mínimo e falta coração com quem partilhar o meu. Parecem simples decorações sem importância.

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Apesar desta luta entre Deus e Diabo parecer maior do que a minha vontade de recuperar o destino da humanidade, tudo parece ser lançado demasiado rápido e sinto uma espécie de bipolaridade em todos os contactos que tenho: num momento estou a ser ofendido por um monstro com mais dentes que palavras, e no outro falo com uma fada super fofa que parece ter saído de um anime. Há que estar preparado para tudo.

Mas tanta mudança, tanto dramatismo, cai um pouco em saco roto com tão pouca informação e tão fraco desenvolvimento das outras peças neste enorme tabuleiro de xadrez enigmático e obscuro.

Considerações finais

Grandes batalhas com variados amigos e inimigos, esta minha caminhada pode tornar-se aborrecida para espíritos menos pacientes e que não saibam lidar com a frustração de tudo acabar de um momento para o outro.

 O mundo que me rodeia é imperdoável, mas de uma beleza singular que os verdadeiros entusiastas vão encontrar em pelo menos 70 longas horas de decisões difíceis.

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Mas tenho que confessar que parece faltar alguma alma à minha estória e a todos os seus avanços e recuos que se tornam confusos e ambíguos para o fim desta minha jornada.

A música que ecoa na minha mente é estranha, mas de beleza incrível, mas sinto falta de companheiros que interajam comigo e que me acompanhem. Esta minha estória necessitava de mais gente com quem a partilhar.

Shin Megami Tensei V é bizarro do início ao fim, que se destaca por isso mesmo. É aproveitar a viagem de completo devaneio!


+ Customização de monstros incrível
+ Música e ambientes bizarros
+ Jogo longo e trabalhoso

– Falta de companheiros
– O grinding exigente
– Não será para todos

N.R.: A análise a Shin Megami Tensei V foi realizada numa Nintendo Switch com uma cópia do jogo, gentilmente cedida pela Nintendo Portugal.

Paulo Tavares: Professor de ocupação, jogador por diversão. Guarda religiosamente as cassetes do seu Spectrum 128k. Leva demasiado a sério a discussão de melhor Final Fantasy. 7, fim de conversa.
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