Diversidade precisa-se. Startups vão dar o exemplo?

A falta de diversidade de género, racial, de idades, nacionalidades, (in)capacidades, religião ou educação é um ‘bug’ que a indústria tecnológica ainda não conseguiu resolver. Esta é a convicção de um grupo de oito ‘super mulheres’ do ramo tecnológico que acabam de lançar uma nova iniciativa – Project Include – para reverter esta realidade. O projecto conta com os inputs da ex-CEO interina do Reddit, Ellen Pao, bem como de outras peritas envolvidas em empresas como o Pinterest ou a Slack, colocando, como já vem sendo hábito, o dedo na ferida ao afirmar que “a cultura tecnológica tornou-se mais exclusiva e menos diversificada, nos últimos cinco anos”.

E porque não incentivar as startups a liderar esta revolução? Perspetivas, recomendações, casos de estudo, materiais, ferramentas…tudo um pouco pode ser encontrado pelo Include para ajudar CEOs e respetivas equipas a conduzir as empresas rumo à inclusão.

Motivações e provas para sustentar a pertinência da iniciativa não faltam. É apontado um estudo que mostra como o preconceito resulta em discriminação ao nível da educação, contratação, promoção, salários e na captação de pessoas de cor; são expostos dados partilhados por gigantes tecnológicas – como a Amazon, Apple, Cisco, Facebook, Google ou Yahoo! – que espelham “uma falta extrema de diversidade”; ou, ainda, uma investigação da McKinsey que quantifica os benefícios da diversidade racial, étnica e de género, entre eles a melhoria do desempenho financeiro das empresas.

Se voltarmos um pouco no tempo percebemos que a temática não é, de todo, nova. Há muito que a tónica tem sido posta na falta de diversidade e discriminação. Algumas das mulheres que integram o programa Include, aliás, foram protagonistas de alguns acontecimentos no passado. Todos eles em prol de uma maior equidade de direitos.

Ellen Pao, por exemplo, foi destaque nos maiores sites de tecnologia internacionais depois de entrar com uma acção judicial contra a empresa de capital de risco Kleiner Perkins, alegando discriminação de género – a qual acabou por perder, como conta o Mashable. Além disso, enquanto CEO interina da Reddit, Elle Pao travou uma luta pela eliminação das negociações salariais durante o processo de contratação, que, diz, prejudica as mulheres.



Outro dos nomes que salta à vista é o de Tracey Chou, especialista em engenharia de software no Pinterest que em 2013 levantou a voz para pedir maior transparência no que toca aos números da diversidade.

 

Alguns ventos favoráveis

Mas nem tudo são maus exemplos, naturalmente. Embora não tivesse uma estratégia para a diversidade e inclusão quando nasceu, em São Francisco, em 2008, a empresa de comunicações cloud Twilio desenvolveu-a organicamente, tendo bons resultados.

O que começou por ser a intenção de duas engenheiras em conversar sobre as estatísticas de diversidade de uma grande empresa tecnológica, rapidamente passou a almoços financiados pela empresa em que grupos debatiam tópicos que achavam pertinentes e, posteriormente, à formação de grupos de recurso dos colaboradores. Hoje são seis e qualquer um pode participar e falar sobre os seus problemas.

“As histórias das pessoas ensinam os outros sobre experiências e obstáculos, construindo um melhor espírito de comunidade dentro da empresa e ligações multifuncionais”, explica Dominique de Guzman, um engenheiro que lidera os esforços internos para a diversidade na Twilio.

Também a Microsoft, a SAP, a Freddie Mac e a HP Austrália iniciaram programas para contratar pessoas com Perturbações do Espectro do Autismo. A multinacional SAP, especificamente, tem perseguido o objetivo de que 1% da sua força de trabalho a nível global seja composta por estes colaboradores, sendo que mais sucursais já materializaram esta premissa, como são o caso do Brasil, Canadá, República Checa, Alemanha, Índia, Irlanda e Estados Unidos.

Esta iniciativa da multinacional de origem germânica conta, desde 2013, com o apoio da Specialisterne, uma empresa social sediada na Dinamarca que ajuda os portadores de autismo a encontrar emprego e cuja finalidade é integrar um milhão destes colaboradores no mercado de trabalho à escala global.

Mulheres e TIC, um casamento benéfico

Seja como for, dentro da esfera da diversidade, o género é uma das componentes que mais tem agitado o debate internacional. O número de mulheres na área tecnológica continua aquém do desejado: nos Estados Unidos, por exemplo, está abaixo dos 20%.  Enquanto isso, em Portugal 86% dos postos de trabalho em tecnologias de informação são ocupados por homens e apenas 14% por mulheres, segundo o Eurostat, mas Lisboa já está a tentar equilibrar esta balança. Se olharmos para a Europa, apenas 30% dos cerca de sete milhões de profissionais do sector TIC são mulheres – num sector que cria perto de 120 mil postos de trabalho por ano -, prevendo-se que em 2020 haja um ‘gap’ de 90 mil empregados nesta área.

Quais são, então, as vantagens em promover o envolvimento feminino? Basicamente, um crescimento anual do Produto Interno Bruto europeu de nove mil milhões de euros, de acordo com um estudo de 2013 da Comissão Europeia. Os benefícios estendem-se também às próprias profissionais que operam nesta área, adianta o mesmo documento, que ganham quase mais 9% do que outras mulheres noutros sectores da economia, tendo maior flexibilidade na gestão das suas agendas e sendo menos vulneráveis ao desemprego.

O que está dito, está dito…

Apesar do aumento da consciencialização e de apoios que vão surgindo, ainda há muito por fazer para contrariar a minoria feminina nas TIC. Selecionámos alguns dos pensamentos sobre este tema partilhados por mulheres que conquistaram um lugar ao sol no universo tecnológico:

 

“Cada um de nós é capaz de definir ambição e progresso. O objectivo é trabalhar para um mundo onde as expectativas não sejam traçadas com base em estereótipos que nos atrasem, mas sim pela paixão pessoal, talentos e interesses”. [Sheryl Sandberg, diretora de operações do Facebook]

“A tecnologia é uma grande carreira para as mulheres: é uma área criativa, social, envolvente e, mais importante, é uma forma de mudar o mundo. O nosso mundo está a ser mudado pelo digital e se as mulheres não fizerem parte estamos a perder todo um grupo de pessoas com ideias interessantes”. [Susan Wojcicki, diretora executiva do Youtube]

“Se conseguirmos encontrar algo pelo qual sejamos realmente apaixonados conta muito pouco se somos homens ou mulheres. A paixão é uma força que neutraliza o género. Recuso-me a ser estereotipada”. [Marissa Mayer, diretora executiva da Yahoo!]

“Já vi mulheres, que estavam bastante interessadas na área tecnológica, a terminar o seu curso, mas depois decidiram não apostar numa carreira porque não estavam convictas sobre o facto de vir a trabalhar durante 20-30 anos numa indústria que é dominada pelos homens”. [Padmasree Warrior, diretora executiva do NextEV]

Nunca senti qualquer problema que seja em ser uma mulher na área tecnológica”. [Gwynne Shotwell, Presidente e diretora de operações da SpaceX].



Patrícia Silva: Jornalista há quatro anos, desenvolvi um carinho especial pelas novas tecnologias depois de trabalhar numa publicação ligada às cidades inteligentes. Tenho particular curiosidade pelo mundo mobile e Internet of Things, mas todo o universo tecnológico tornou-se atraente.
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