Steamworld Heist: Cowboys do espaço

Uma bala certeira. É assim que podemos descrever Steamworld Heist, um jogo de tiros em estilo RPG que desenrola-se no espaço e num universo dominado por mecatrónica movida a vapor. Parece-lhe interessante?

A tarefa para o estúdio independente Image & Form Games não era fácil: o seu último jogo, Steamworld Dig, tinha sido um sucesso entre a crítica e os jogadores. Foi bem recebido por conseguir apresentar um estilo de jogo ligeiro e divertido, bem balanceado com uma arte steampunk característica e pequenos detalhes sonoros que ajudaram a tornar o título marcante.

O estúdio decidiu mexer no conceito, mas preservou o elemento que talvez mais ajudou a destacar o jogo anterior: o estilo das personagens. Recorrendo ao mesmo conceito steampunk – uma mistura de máquinas futurísticas com a locomoção a vapor – idealizaram desta vez uma aventura espacial.

Para tornarem a tarefa ainda mais apetecível decidiram criar um jogo de tiros baseado por turnos, ao bom estilo role playing game. O resultado é mais um título interessante e de fácil recomendação: possivelmente há muito que não joga uma aventura como Steamworld Heist e possivelmente não vai fazê-lo até que o estúdio volte a pegar no conceito.

Esta mistura explosiva de vários elementos podia ter resultado num jogo confuso, mas felizmente acabou por transformar-se numa odisseia espacial divertida. Numa altura em que do nosso lado já estão concretizadas todas as missões do jogo fica a certeza que estamos perante um título que merece uma oportunidade por parte de todos os que têm uma Nintendo 3DS.

Western movido a vapor

O jogo não tem uma história muito profunda, mas existe um enredo interessante o suficiente para manter o jogador entretido à medida que vai passando as missões.

Em determinado ponto o fio condutor de Steamworld Heist quase faz lembrar o de outras histórias galácticas que aconteceram há muito, muito tempo… Existem os cowbots, a fação do povo robótico que vive em condições mais precárias. Existem grupos de mercenários que procuram explorar todas as situações a seu favor. Há um exército imperial que tenta manter o controlo sobre todo o universo. E claro, há uma ‘ameaça fantasma’ que está adormecida.

Se isto nos é explicado logo no primeiro minuto e meio do jogo, durante a introdução, a verdade é que vão ser necessárias várias horas para compreender melhor o desenrolar do enredo.

O jogador aventura-se no jogo sob o cobre da capitã Piper Faraday. Ela é uma desertora do exército imperial depois de lhe ter sido dada uma missão abalou a sua forma de ser: podia bombardear uma região, matar alguns rebeldes e quem sabe cowbots ou podia fugir e procurar outras aventuras. Escolheu a segunda opção e foi acompanhada do parceiro de sempre e comandante da sua nave, Wonky.

Na prática a capitã Piper Faraday torna-se uma mercenária do espaço que pilha e luta contra outros mercenários. Mas neste sua jornada acaba por ganhar um propósito muito maior.

O jogador vai acabar por estar numa situação em que estará a lutar contra o próprio exército imperial na esperança de estar a fazer o bem, quando na realidade estará apenas a acordar um mal muito maior. Esta reviravolta só será notória numa parte já avançada do jogo, o que acabou por ser uma surpresa agradável. Não precisamos de revelar o enredo todo aqui pois será bem mais divertido descobri-lo.

Não existem momentos muito intensos de história. À medida que as missões vão sendo completadas vamos encontrandos algumas personagens secundárias que nos dão pistas sobre o que devemos seguir e que ajudam a construir a história.

Durante a viagem espacial vamos também conhecendo novos parceiros de combate. E este é um dos pontos positivos de Steamworld Heist. Cada um à sua maneira é diferente tanto na personalidade como no estilo de jogo. Isto fará com que uma mesma missão possa ser repetida vezes sem conta usando estilos de combate e táticas diferentes.

Estas personagens têm também estilos de humor diferentes. As piadas ‘secas’ e inteligentes são uma constante ao longo do Steamworld Heist e é apenas mais um dos factores que ajuda a tornar o título apelativo.

Não é um jogo que o deixe com o coração aos saltos de emoção, pois é muito mais tático do que emocional.

4x3x2x1

É a componente mais importante do jogo: a tática. E como é que sei isto? Pois só fazendo ajustes nas personagens, nas armas e na própria abordagem da missão é que por vezes é possível passar o nível ou conseguir superá-lo com a pontuação máxima.

Cada personagem tem um estilo de jogo diferente que lhe permite usar – ou não usar – diferentes armas. Há personagens mais talhadas para armas de estilo ‘à queima roupa’, há outras que são melhores a usar bazucas e lança-granadas.

Cada personagem tem depois diferentes níveis de vida e de distância. A distância é o número de passos que cada personagem pode dar. Imagine um nível dividido em quadrículas e se um cowbot só puder dar sete passos, então apenas poderá movimentar-se em sete dessas quadrículas. O conceito é mais fácil de assimilar jogando do que explicado, isso é garantido.

Depois funciona um pouco como o jogo da batalha naval. O jogador tem movimentos limitados, assim como o seu inimigo. Em muitas missões serão necessários avanços e recuos para colocar as suas personagens nas melhores posições para abater os inimigos.

Para ajudar nesta tarefa existe uma grande variedade de armas que vão sendo encontradas nas rusgas feitas às naves adversárias ou que podem ser compradas visitando as típicas lojas de acessórios que existem nos role playing games (RPGs).

Existem armas que fazem quatro disparos seguidos, mas provocam menos danos. Há armas que têm uma mira laser e que permitem fazer head shots a cada ronda. Há canhões de plasma que limpam tudo por onde passam – mas nem sempre chegam para tombar o adversário à primeira.

Para reforçar ainda mais o sentido de RPG e de tática, cada personagem pode levar a jogo dois acessórios diferentes. Estes itens podem ser caixas de recuperação de vida, podem ser granadas de longo alcance ou podem ser sapatos que garantem mais movimentos a cada cowboy do espaço.

Campónio, militar, SWAG, há muitos chapéus por onde escolher. São mais de 100!

Há um último espaço de acessórios dedicado exclusivamente a chapéus. É a única personalização que o jogador pode conferir às suas personagens e mesmo parecendo simbólico, a verdade é que a meio do jogo vai dar por si a arriscar o sucesso de uma missão só para apanhar um mero chapéu que está perdido numa nave inimiga.

Para que o jogo não se torne monótono a Image & Form Games preparou missões que requerem diferentes colaborações. Há missões só para uma personagem, há algumas em que deve levar apenas um par de robôs e há outras onde são necessários três e quatro pistoleiros.

O conceito de jogabilidade é fácil de assimilar, mas com o treino virá a prática. Se pensa que ao fim de duas horas está a jogar bem, ao fim de 12 horas terá a certeza de que aquilo que fez no início foi cometer muitos erros de palmatória.

Além da evolução do jogador per si, também as personagens evoluem. Cada missão bem sucedida permite que os steambots acumulem pontos de experiência que são necessários para evoluir de nível. E cada nível desbloqueado em cada uma das personagens desbloqueia diferentes habilidades que podem depois ser usadas em combate.

E se há batalhas que são ultrapassadas sem grande dificuldade – o jogador tem a liberdade de escolher a dificuldade para cada nível -, outras terão de ter em conta os diferentes planos táticos que aqui descrevemos. Há tiroreios contra os bosses que só ao fim de algumas tentativas serão ultrapassados.

Há robôs movidos a vapor muito duros de roer e cuja maldade é ainda maior. A si cabe abatê-los, à bruta ou da forma mais limpa possível.

Estilo autêntico

O que o estúdio Image & Form Games está a criar é algo único. É uma identidade de tal forma forte e vincada que se alguém arriscar algo semelhante rapidamente vai ser acusado de inspiração excessiva nos jogos Steamworld.

Falo obviamente do estilo steampunk das suas personagens, das histórias em torno de robôs movidos a vapor e do estilo de desenho característico – básico, mas cheio de pormenores; com uma paleta de cores reduzida, mas combinada para que se lembre das diferentes personagens e dos seus detalhes.

O estúdio independente não se preocupa apenas em criar personagens características. Também cria um ambiente condizente. Todas as peças fazem sentido em conjunto ou em separado. Conseguiram criar um verdadeiro universo.

Os gráficos em 2D são uma escolha que assenta muito bem neste estilo steampunk. E mais: funcionam de forma muito positiva no ecrã 3D da Nintendo 3DS já que permitem ter uma ideia das diferentes camadas que compõe cada nível.

Gostei do facto de haver um motor de jogo que gera o mesmo nível de forma diferente sempre que o joga. Isto é, a missão e os elementos básicos da missão são os mesmos – como destruir geradores de energia -, mas as plataformas, as portas e a disposição das proteções dentro das naves inimigas são sempre diferentes. Um grande tiro no aborrecimento e na repetição é o que isto é.

A banda sonora foi composta pelo grupo Steam Powered Giraffe, que existe na realidade

Se do lado visual o trabalho está bem feito, a componente sonora também foi muito bem desenvolvida. Não há propriamente uma banda sonora épica a acompanhar este western espacial. Mas essa é uma decisão propositada.

Ao escolher uma música ambiente baixa e pesada, todos os sons de disparos, de embates, de passos dados e das sirenes de alarme – acredite, vai reconhecê-las em qualquer lugar – sobressaem. E estes sons são muito característicos, como o eram já no jogo anterior, o Steamworld Dig.

Para finalizar

Steamworld Heist é um jogo de qualidade superior. Mesmo jogando ainda no campo dos títulos indie, nota-se claramente que já tem toda uma estrutura bem pensada por parte do estúdio Image & Form Games quando estão a desenvolver uma nova aventura.

A odisseia dos nossos cowboys espaciais é diferente em vários aspetos. Não só pela mistura de elementos que faz – é um sidescrolling game, um RPG, um shooter e um jogo tático -, como pela forma em que é executado. O design visual é muito bom e tem uma identidade muito forte, pena que o design sonoro não aposte numa banda sonora mais marcante para ter um impacto semelhante.

O título é por agora um exclusivo da Nintendo 3DS, mas está prevista a sua chegada a mais sistemas de jogo ao longo do ano: PC, Xbox One, Wii U, PlayStation 4 e PlayStation Vita. Na portátil da Nintendo tem a vantagem de o jogador poder usar as animações em 2D para criar uma experiência de jogo tridimensional. Parece algo que não faz sentido, mas quando experimentar saberá do que estou a falar.

Este não é um jogo de emoções fortes, mas tem muito sentido de oportunidade e vai obrigá-lo a parar para pensar se está a tomar as melhores decisões. Os tiroteios também podem não ser os mais intensos, mas isso não quer dizer que não vá sentir a pressão de um tiro falhado ou do tempo a lutar contra si.

Acima de tudo é um jogo divertido. Não deviam todos ser assim? Sem que dê por isso passará duas ou três missões de seguida e se estiver à vontade com a língua inglesa é provável que acabe por rir das piadolas que os cowbots vão contando.

Quinze horas deverão ser-lhe suficientes para completar este western intergalático. Pode demorar mais, pode demorar menos: tudo depende se vai querer ter toda a coleção de chapéus que o jogo disponibiliza.

Steamworld Heist
Design
9
Enredo
7
Jogabilidade
8
Sonoridade
7
Envolvimento
8
Reader Rating2 Votes
8.1
7.8
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