Hideo Kojima. É este o nome que cada vez que aparece num ecrã, numa notícia, num podcast, paramos para ler, ouvir e analisar o que este homem tem a dizer em todas as formas de entretenimento. É o maior visionário da indústria dos videojogos, quer se goste dos teus títulos ou não, é inegável que a sua compreensão do que é um videojogo transcende barreiras nos temas, jogabilidade e história.
Com Death Stranding, Kojima conseguiu mostrar-nos que a solidão de um homem também pode ser uma mecânica de jogo e que meras paisagens podem ser os melhores gráficos do mundo. Death Stranding 2: On the Beach, a sequela não apenas expande os conceitos fundamentais do original, mas os aprofunda de maneira que marcam sua posição como uma das experiências mais únicas e ambiciosas dos videojogos.
Mais uma viagem…
A premissa central de DS2 parte de uma pergunta provocadora: “Deveríamo-nos ter conectado?” Esta questão está presente em toda a narrativa, mergulhando Sam Porter Bridges (Norman Reedus) e o jogador num mundo que apesar dos esforços do primeiro jogo para estabelecer a rede quiral e reconectar os Estados Unidos, que parece estar a desintegrar-se ainda mais.
A história começa cerca de 11 meses após os eventos do primeiro Death Stranding. Sam vive uma vida reclusa no México, e cria Lou (que agora é uma criança, não um BB no seu casulo), abandonou as suas tarefas de estafeta devido à ascensão da APAC (Automated Public Assistance Company) fundada após o encerramento da Bridges.
No entanto, a paz de Sam termina quando Fragile (Léa Seydoux), agora líder da nova organização Drawbridge, o recruta para uma nova missão, conectar o México e, posteriormente, a vasta Austrália à rede quiral. O objetivo é ativar os plate gates que poderiam, em última instância, reconectar todos os continentes do mundo.
A viagem de Sam é marcada pela ameaça constante de Higgs (Troy Baker), que agora comanda um exército de ghost mechs, inimigos robóticos e alguns impiedosos nos seus ataques. Esta nova versão de Higgs é mais enigmático, e serve mais uma vez como o antagonista de Sam. Além disso, Sam vê-se levado para algumas anomalias, semelhantes às do primeiro jogo envolvendo Cliff Hunger, mas agora enfrenta um soldado chamado Neil (Luca Marinelli), em que a ligação com Lou e o passado de Sam é um dos grandes mistérios do jogo.
O guião de Kojima, embora ainda repleto de simbolismos e metáforas (e parece que cada vez que damos um passo, uma nova teoria invade-nos as ideias), Death Stranding 2 é mais emocionante do que o anterior. A relação de Sam com Lou é um ponto emocional central, mostrando a evolução de Sam de um homem com aversão ao toque para um pai dedicado.
A história explora temas como o luto, a resiliência e as consequências inesperadas da conectividade, aprofundando questões sobre até que ponto a humanidade se deve esforçar para se unir e os sacrifícios que isso pode exigir. O elenco de luxo expandiu-se relativamente ao primeiro, incluindo participações notáveis de Elle Fanning, George Miller e Fatin Abdallah, que enriquecem e muito como a história se desenrola. Troy Baker que tem o papel de Higgs rouba a atenção toda, uma das suas melhores prestações e em minha opinião apenas atrás de Joel de The Last of Us. Troy faz um papelão que para além de evocar o seu papel em Death Stranding na perfeição, traz uma nuance diferente na sequela que é refrescante, mesmo para uma personagem como Higgs, um amante do caos.
Evolução na jogabilidade e na progressão
Uma das maiores evoluções em Death Stranding 2 é sem dúvida a sua jogabilidade. Embora mantenha a mecânica central de gerenciamento de carga e progressão no terreno, o jogo melhorou todos os aspetos relativamente ao anterior e introduz novidades significativas que tornam a experiência mais fluida, dinâmica e interessante.
A exploração continua a ser o cerne do jogo, mas com melhorias enormes. A capacidade de combinar escadas para aumentar o seu comprimento e mais escolhas na construção dos PCC agilizam a navegação. Veículos, como camiões e o novo veículo “Magellan” da Drawbridge (uma base móvel que se movimenta nas correntes de alcatrão), são introduzidos mais cedo e são mais personalizáveis, e podemos melhorá-los com baterias extras e até armas. A grande novidade é a construção de um sistema de monorail que liga minas isoladas (que podemos por a funcionar em troca de materiais de construção) e que permite o transporte rápido de grandes quantidades de carga, mudando drasticamente a logística em certas áreas, principalmente para quem se foca em construir estradas e infraestruturas que irá facilitar a progressão no vasto mapa.

No combate vale tudo, menos matar
A maior mudança no combate de Death Stranding 2 é a quantidade de movimentos e armas que podemos ter. Sam agora tem um arsenal mais diversificado de armas e ferramentas, categorizadas como “Anti-Humano”, “Anti-BT” e “Anti-Mech”. O combate corpo a corpo foi bastante melhorado para ser mais intuitivo, com a adição de efeitos de câmara lenta que tornam as sequências de ataque mais cinemáticas. Os jogadores têm maior liberdade para abordar os encontros, podendo optar por confronto direto e ação furtiva para evitar completamente os inimigos, o que é bastante satisfatório, mas certas bases estão realmente artilhadas e fica cada vez mais difícil não sacar de uma arma.
A introdução de ghost mechs e BTs mais perigosos força-nos a adaptar estratégias, utilizando fraquezas e tipos de munição específicos. O jogo oferece uma grande quantidade de armas não letais, incentivando-o até, já que os mortos reaparecem como BTs e pode levar ao void (uma explosão enorme no mapa), mas lidar com os corpos requer levá-los a centros de distribuição para serem descartados, o que adiciona uma camada de logística ao jogo. Mas na minha experiência, só matei dois inimigos em todo o jogo e foi por descuido com um lança mísseis. Logo, mesmo que gostei de andar de dedo no gatilho, as armas são quase todas não letais.
Habilidades e Personalização
O jogo introduz um sistema de árvore de habilidades (Automated Porter Assistant System) dividido em categorias de combate, furtividade e serviço (porque ele faz entregas para salvar o mundo). Isso permite que os jogadores personalizem o estilo de jogo de Sam, melhorando habilidades de acordo com as suas preferências. Além disso, o novo menu “Corpus” simplifica o entendimento do lore, com resumos da história e dicas de jogabilidade, acessíveis até mesmo durante as cinemáticas. Há também mais opções de diálogo em certas cinemáticas, que dá uma maior imersão e escolha na interação com os outros personagens.
O Social Strand System está de volta obviamente, e permite-nos ajudar outros jogadores e vice-versa compartilhando recursos e construindo estruturas que aparecem nos mundos uns dos outros. Essa cooperação continua uma parte fundamental da experiência, e reforça a mensagem de conectar o mundo.
Ao ligar uma localização à rede quiral, aparecem várias construções de apoio à nossa progressão no mapa. Pontes, estradas, carregadores de bateria entre muitos outros vão estar disponíveis já que outros jogadores as colocaram lá e nós podemos fazer o mesmo. Não há nada mais satisfatório que colocar uma zip-line no seguimento de outra para que o circuito esteja completo e facilite o trajeto a todos no servidor.

Solidão e melancolia
Graficamente, Death Stranding 2 é um regalo para os olhos. Utilizando o Decima Engine, este jogo eleva o padrão em fidelidade gráfica, com paisagens incrivelmente detalhadas, os modelos dos personagens extremamente foto realistas e efeitos climatéricos impressionantes. Sente-se a atmosfera criada por Kojima seja na vastidão dos desertos, nas florestas ou nas ruínas de cidades perdidas nas montanhas. A iluminação, as transições realistas entre o dia e a noite e a tensão que surge quando começa a chover, tornam a exploração ainda mais cativante.
A direção de arte de Yoji Shinkawa é o que completa a visão de Hideo Kojima. Apresenta modelos de criaturas e veículos que são simultaneamente extraterrestres, mas que funcionam perfeitamente com o guião, uma mistura de ficção científica com um mundo pós-apocalíptico.
A banda sonora, composta por Ludvig Forssell, é mais uma vez uma parte importante da experiência, com composições atmosféricas que aumentam a sensação de solidão também de tensão bem como as músicas licenciadas que cuidadosamente são introduzidas em momentos chave das nossas caminhadas. Desde Caroline Polachek, Low Roar, Silent Poets, CHVRCHES e Woodkid, que abre o jogo com “Minus Sixty One”, numa das melhores introduções de um jogo de sempre e com “To the Wilder” cimenta o sentimento de melancolia em toda a aventura de Sam Porter Bridges.
Nos efeitos sonoros, Death Stranding 2 é perfeito, desde os passos de Sam em todos os tipos de terreno aos sons assustadores dos BTs, a excelente representação dos atores, aos sons da chuva, tempestade de areia e tremores de terra. O feedback háptico do Dual Sense contribui para que estejamos imersos no jogo, já que há sempre uma reação tátil no comando aos sons ambientais do jogo.
O ambiente em DS2 é mais imprevisível desta vez. Há um ciclo dinâmico dia e noite que afeta o comportamento dos inimigos, desastres naturais como temores de terra, inundações, tempestades de areia que reduzem a visibilidade e incêndios florestais, alteram constantemente a paisagem e força-nos a encontrar caminhos alternativos.
Ligando todos os pontos
Assim como o anterior, Death Stranding 2: On the Beach é um jogo profundamente temático. A pergunta “Deveríamo-nos ter conectado?” ecoa já que a interconectividade e o isolamento se tornaram em temas cada vez mais presentes e Kojima parece explorar estes temas sempre atuais sempre com o seu twist. O jogo aborda o conceito de evolução e adaptação, tanto para Sam quanto para o mundo em seu redor. As novas ameaças e os fenómenos ambientias exigem que o jogador se adapte e utilize todas as suas ferramentas e habilidades.
A metáfora da praia (Beach) continua a ser uma ligação entre mundos, mas com novas ramificações que aprofundam a história criada pelo primeiro jogo. De salientar que achei a história de Death Stranding 2 bem mais fácil de acompanhar relativamente ao original. Claro que já conhecemos as expressões e termos criados por Kojima mas no primeiro jogo tive de ir pesquisar o significado do seu final, porque senti que a história era densa demais. Na sequela é definitivamente mais simples, menos complexa e a opção “Corpus” ajuda muito na sua compreensão.
Considerações finais
Death Stranding 2: On the Beach não é apenas uma sequela, é uma evolução brilhante de uma das melhores PI dos videojogos. Os pilares que tornaram o original tão bom estão lá, a exploração, narrativa complexa e a sua estética única sobe a novos patamares, pondo a fasquia muito alta para a concorrência. Para os fãs do original, DS2 é um retorno triunfante ao mundo de Kojima, oferecendo uma experiência ainda mais impactante e emocional.
Death Stranding 2: On the Beach é uma prova de que Hideo Kojima continua a ser um mestre em contar histórias em criar mundos imersivos e alternativos, e este título é sem dúvida um dos destaques de 2025 e um marco na indústria dos videojogos.


