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A estratégia e o homem que fizeram ‘los bandidos’ de Narcos um sucesso nas redes sociais

Pablo Emilio Escobar Gaviria, mais conhecido como Pablo Escobar. Teve uma história e pêras ao tornar-se num dos maiores barões da droga da América Latina do século passado. A ascensão, o domínio e a queda daquele que é apelidado de ‘Rei da Cocaína’ está a ser retratada na série Narcos.

A produção da Netflix atingiu um sucesso de escala global. Não só pela trama montada e pelas interpretações – que valeram duas nomeações para os Globos de Ouro -, mas muito também por causa da campanha digital que foi montada em torno da série.

A agência norte-americana Mistress foi a escolhida para levar Narcos a todo o mundo e o criativo Damien Eley foi a mente responsável pela sua execução. E bem: no ano passado a série conseguiu mais interações nas redes sociais do que a toda poderosa Guerra dos Tronos. A agência conquistou ainda dois Shorty Awards com a campanha montada.

Co-ke-no-mics. Esta palavra ajuda a explicar bem o plano de Damien e da sua equipa para Narcos. A história era complexa e por isso era necessário descontruí-la. Numa sociedade com cada vez menos tempo, servir-lhes infografias em modo de snack foi uma das soluções encontradas. Resultou.

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As cokenomics ajudaram a perceber de forma simples qual a dimensão dos ‘trabalhos’ de Pablo Escobar e do Cartel de Medellín. Mas para ser um sucesso à escala global não chega.

Damien Eley decidiu que o Pablo Escobar da série Narcos seria uma forma de passar mensagens à luz dos acontecimentos mais quentes dos EUA. Por exemplo quando usou um chapéu à Donald Trump e roubou a cena mediática numa das noites mais quentes da campanha eleitoral dos EUA.

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Para os portugueses os melhores exemplos vêm talvez da página de Facebook de Narcos. A versão que vemos é a brasileira, mas o bom humor e a relação de proximidade com a comunidade marcam a estratégia digital da série.

O Patrão e a equipe do Cartel desejam a você e sua família um feliz Natal e um próspero Ano Novo.

Publicado por Narcos em Terça-feira, 22 de Dezembro de 2015

 


Sorte a nossa que Damien Eley passou por Portugal para vir ao ClickSummit e aproveitamos para meter a conversa em ideia. É que este homem não é só o barão das ‘cokenomics digitais’. Foi também ele quem transformou a Hot Wheels numa marca de entretenimento global e não apenas de brinquedos, e deixou os norte-americanos corados com uma campanha que serviu para promover um dos reality shows mais questionáveis de sempre.

FUTURE BEHIND – Olá Damien. Trabalhou na campanha digital da série Narcos. A primeira pergunta que temos de fazer é: plata o plomo?

DAMIEN ELEY – Definitivamente plata [😄].

FUTURE BEHIND – Conseguir a atenção das pessoas no mundo online é difícil. Qual é o grande segredo para chegar até às pessoas no meio de tanto ruído?

Damien Eley – Penso que tens de ser aventureiro. Tens sempre de esforçar-te muito para chegar às pessoas de uma forma orgânica. Obviamente quando estás a trabalhar com bom material ajuda, mas penso que uma boa parte do trabalho vai para perceber a demografia e conseguir responder-lhes em tempo real quando estamos a falar de redes sociais.

Portanto sim, diria que muito trabalho vai para o entendimento da audiência.

FUTURE BEHIND – Já trabalhou com muitas e diferentes marcas. Qual o maior desafio que já teve e qual o projeto do qual gostou mais?

DAMIEN ELEY – Provavelmente o trabalho mais influente que a Mistress já fez foi com a Hot Wheels, no qual queríamos ajudar a transformar uma marca de brinquedos numa marca de entretenimento. Isso foi uma grande campanha que fizemos para eles. Vários anos, acrobacias que acabaram em recordes do mundo… isso foi formativo para nós como agência.

Mas o que mais gosto no que fazemos é estarmos constantemente a explorar novos caminhos, novos meios. É uma área muito extensa nos nossos dias, com muitas opções. Penso que tudo o que estamos a fazer neste momento está a testar os limites do que pode uma agência fazer e como trabalhamos como agência.

FUTURE BEHIND – Encontrámos referências a dizer que a Mistress arrisca bastante. Mas por vezes o cliente pode não gostar muito do risco. Já alguma vez correu mal?

DAMIEN ELEY – Gostamos de experimentar, faz parte da nossa filosofia. Mas com essa experimentação tentamos ancorar tudo o que fazemos com bastante disciplina. Trabalhamos de muito perto com os nossos clientes, gostamos imenso de colaborar e fazemos muito trabalho estratégico.

Normalmente estamos em total acordo sobre para onde vamos e é aí que realmente conseguimos empurrar as ideias. Na maior parte do tempo os nossos clientes estão preparados para nós lhes mostrarmos como podemos ser experimentais ou desafiantes.

Penso que muitos dos clientes da Mistress consideram-se marcas desafiantes e nós temos uma mentalidade de desafio. Somos uma empresa pequena, mas gostamos de lutar acima do nosso peso.

Talvez algumas coisas não correram da maneira como planeámos, mas na maior parte do tempo vamos de mãos dadas com o cliente. Não houve muitos desastres [😄].

FUTURE BEHIND – A série Narcos é muito popular. O que fizeram e como construíram esta campanha?

DAMIEN ELEY – Um dos melhores aspetos de Narcos que identificámos logo de início é que era uma história muito complexa. E tudo se resumiu a como partímos em partes uma história complexa e que tinha temas incríveis que nós sabíamos que iam ser populares: obviamente a cocaína e todo este mundo do contrabando.

A história tinha um sentimento muito documental que foi baseado na vida real, portanto muito do trabalho que fizemos foi tentar desbloquear essa complexidade. Assim que encontrámos ferramentas para o fazer conseguimos divertir-nos imenso com os conteúdos.

O Netflix é um cliente muito desafiante, eles exigem muito de ti e mais uma vez foi um processo muito colaborativo. Outro aspeto incrível de Narcos é que era uma propriedade global , o que nos colocou alguma pressão em fazermos o trabalho de forma simples para que pudesse ser traduzido para diversas culturas e idiomas.

FUTURE BEHIND – Por exemplo, a página portuguesa do Narcos é brasileira. A Mistress tem alguém no Brasil a gerir essa comunidade ou tem algum brasileiro na equipa?

DAMIEN ELEY – Tivemos falantes espanhóis na nossa equipa, a maior parte das ligações brasileiras vieram através da Netflix. Estivemos a trabalhar com a sua equipa de marketing global e eles tinham equipas no Brasil, por exemplo, e muitas outras espalhadas pela América Latina que estavam a expandir os conteúdos que criámos.

Não fomos responsáveis por alguma execução específica em português, mas tudo o que fizemos tinha de ser simples o suficiente para ser transformado para os outros mercados.

FUTURE BEHIND – Assumem que parte do sucesso de Narcos está relacionado com o sucesso da vossa campanha?

DAMIEN ELEY [😄]. Sou sempre muito cuidadoso em dizer que é um efeito colaborativo. O Netflix tem muitas mais agências e o Narcos era uma grande propriedade para eles. Sim, foi uma grande campanha. Gosto de pensar que tudo o que apresentámos foi por termos trabalhado de perto com a Netflix.

FUTURE BEHIND – Há 17 anos que trabalha como criativo publicitário e de marketing…

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Crédito: Consideranddone.com

DAMIEN ELEY – Sim, sou um homem velho…

FUTURE BEHIND – Como é que se mantém fresco, atual e inovador?

DAMIEN ELEY Quando escolhemos abrir a agência em Los Angeles foi um grande momento. Há seis anos L.A. era considerado como um entreposto nos EUA, mas nos últimos seis anos transformou-se totalmente. Sentimos que podíamos entrar dentro do grande mundo da produção que é Los Angeles.

Mas também desde a explosão da Silicon Beach, a área onde a Mistress estava, fomos muito influenciados e sentimos pressão da parte tecnológica da indústria. É um ambiente muito desafiante ter uma agência num local criativo e que está constantemente a competir com as googles e as apples deste mundo. Temos de ser muito inovadores como empresa, estamos constantemente a experimentar novas formas de como conseguimos usar todas as novas tecnologias e Los Angeles é capaz de ser um dos melhores sítios do mundo para fazê-lo neste momento.

FUTURE BEHIND – A Mistress tem grandes clientes. VH1, Ubisoft, Red Bull, PayPal, Netflix, Mattel. Alguma marca específica com quem gostassem de trabalhar?

DAMIEN ELEY – Obviamente quando estás a fazer crescer um negócio queres sempre trabalhar em projetos maiores e maiores. Para nós, estarmos nos EUA, estarmos em Los Angeles, dá-nos essa visão.

Acho que nos safamos muito bem no espaço do entretenimento, adoramos esse tipo de trabalho, mas penso que o que nos mantém entusiasmados é sabermos que podemos aceitar qualquer projeto. Uma parte de mim quer trabalhar com clientes maiores e potencialmente mais conservadores, pois sabemos sempre que vamos encontrar algo interessante para fazer no final do dia.

FUTURE BEHIND – Um exercício. Se lhe pedíssemos para fazer uma campanha para a Google nos próximos 60 segundos, o que iria sair daí?

DAMIEN ELEY – [😄] Se me dessem a oportunidade de trabalhar com a Google agora mesmo acho que produziria um produto tecnológico. O que a Google faz muito bem é que eles inovam dentro da própria marca, têm montada uma infraestrutura incrível para isso.

Experimentar uma nova peça de tecnologia que pudesse usar a infraestrutura deles, isso seria muito desafiador. Adoraria fazer isso.

FUTURE BEHIND – Existem exemplos curiosos na área da publicidade. A Tesla Motors diz que não gasta um cêntimo em anúncios e são uma marca global. Como explica isto?

DAMIEN ELEY – Quando trabalhas muito para construir uma marca e sobre o que significa a tua marca, então existem muitas opções. A Tesla consegue muito in-marketing apenas pela inovação pura que estão a fazer. E quando és liderado por um visionário como o Elon Musk ele é o megafone da marca, ele é agora o que o Steve Jobs foi para a Apple. A marca está a ser canalizada através dele.

O Richard Branson é outro exemplo em como o marketing vem muitas vezes da visão individual. Mesmo em Los Angeles, onde estamos em contacto com outros fabricantes de carros elétricos que estão a começar a aparecer, eles estão a lutar muito para inovarem e conseguirem sair da sombra do Elon Musk.

Penso que no final resume-se a isto: se conseguires estabelecer um tom para a tua marca e mostrar às pessoas a verdade por trás dessa marca, então tens muitas opções, não precisas de ir pelo caminho tradicional, apenas precisas de divulgar a tua visão.

FUTURE BEHIND – Atualmente as empresas têm de preocupar-se com as redes sociais, search engine optimization (SEO), posição nos motores de busca… Quais são as próximas grandes tendências às quais as marcas têm de estar atentas?

DAMIEN ELEY – Agora a ‘cama quente’ na Silicon Beach são marcas como o Snapchat. Estão a evoluir de forma tão rápida que é interessante ver como é que o mundo está a debater-se com essa inovação. O Snapchat está a mover-se tão rápido que a maior parte das marcas com as quais trabalhamos não conseguem antecipar o que podem atingir com a plataforma.

Penso que esse é um grande desafio para toda a gente e coloca muita pressão nas agências para que sejam consultores em todas as ferramentas que estão disponíveis para uso. Só agora é que muitas pessoas estão a aperceber-se o que é o Snapchat e os utilizadores que estão no Snapchat já levam vários meses de avanço. Esta realidade é muito desafiadora.

FUTURE BEHIND – Qual é o grande interesse no Snapchat? É o ambiente imersivo, são os vídeos, é a efemeridade dos conteúdos?

DAMIEN ELEY – Para a maior parte dos jovens com quem estamos a falar nas nossas campanhas o Facebook e o Instagram já são de certa forma irrelevantes. Eles precisam de ter algo que os seus pais e muito dos seus amigos não entendem. Essa é a nossa responsabilidade, como marketers, conseguirmos acompanhar essa velocidade.

FUTURE BEHIND – Para uma nova marca que está a começar [disclaimer: como o Future Behind] que conselho daria para que eles pudessem explodir em apenas duas semanas?

DAMIEN ELEY – Consideramos que a Mistress é uma das nossas marcas e penso que trabalhamos muito para mostrar o que defendemos. Tens de estar em controlo da tua própria visão. Muitas startups partem imediatamente à procura de financiamento e de apoio, mas com o apoio por vezes perdes parte da tua visão.

Começámos muitas empresas e uma coisa que aprendemos é o quão importante é ser fiel ao que acreditam e construir a marca em cima desta base. Quando as pessoas entendem o que é, tens muito mais vantagem.

FUTURE BEHIND – Esse nome, Mistress…

DAMIEN ELEY – Há seis anos todos os cinco parceiros fundadores estavam a trabalhar em partes diferentes do mundo da publicidade e éramos todos bastante seniores. Também passávamos muito tempo a mandar fora os desejos dos nossos clientes em namoriscar com as agências.

Isso foi parte da nossa observação, sobre para onde caminhava o negócio, para onde estava a ir a nossa categoria. Decidimos que queríamos que o namoro com as marcas fizesse parte do nosso modelo de negócio. Não queríamos esconder que estávamos a apresentar propostas fora da relação que as marcas tinham com algumas agências.

E como já éramos marketers seniores conseguimos ir diretamente até alguns dos executivos mais importantes e a partir daí mostrar-lhes até onde conseguiriam ir.

Seis anos depois e esta é absolutamente a norma da indústria. Toda a gente quer uma mistress (amante em tradução livre) [😄].

Agora tentamos não ser a mulher [😄].