À conversa sobre a Xbox One S

O mercado das consolas em Portugal está em quebra. De acordo com dados da GFK partilhados com o FUTURE BEHIND o ano de 2015 fechou com uma quebra de 8% no número de unidades vendidas – a consultora não revela o número específico das vendas, nem total, nem por modelo. Apesar da quebra registada houve uma estagnação no que diz respeito ao valor das transações – ou seja, entre 2014 e 2015 a variação entre as receitas totais das consolas foi de 0%.

Olhando para valores mais recentes vemos que o cenário continua a ser de quebra. Entre o 1º semestre de 2015 e o de 2016 venderam-se menos 19% em consolas e o valor das vendas caiu 14%. Como é que se agita um mercado em dificuldades? Com novos produtos para estimular os consumidores.



A semana passada ficou marcada pela chegada da Xbox One S a Portugal. A nova consola da Microsoft não se apresenta apenas como mais compacta e com um design melhorado, traz várias novidades sobretudo no que diz respeito ao suporte de novas resoluções e formatos de conteúdos.

É possível fazer streaming de conteúdos em Ultra HD, está incluído um leitor Blu-Ray 4K e também há suporte para filmes, séries e videojogos em High Dynamic Range (HDR). Por estes motivos a Xbox One S é possivelmente neste momento o sistema de jogo que melhor se posiciona como ‘consola do futuro’.

O futuro passará sempre pelo 4K e cada vez menos pelo HD ou Full HD, logo, mesmo daqui a cinco ou seis anos a Xbox One S vai garantir-lhe suporte para estes conteúdos, algo que Xbox One original ou a PlayStation 4 não fazem nem vão fazer.

Mas depois existe a questão bicuda de já ter sido anunciada uma nova consola, o Project Scorpio, e essa sim vai trazer suporte para videojogos em Ultra HD.

Para percebermos a estratégia da Microsoft Portugal para a nova consola falámos com a pessoa mais indicada para discutir o tema: a gestora da divisão Xbox em Portugal, Joana Barros.

É fã confessa de Quantum Brake. “Às vezes quando estás a jogar e estás a ver as cenas do jogo, nem consegues distinguir se é jogo, se é a série que está gravada. A qualidade dos gráficos está mesmo muito, muito boa”, disse-nos já no final da entrevista. E também gosta bastante de Tomb Raider – não só do último jogo, mas da saga no geral.



Os jogos ficaram para o fim porque primeiro havia temas interessantes para discutir a propósito do lançamento da Xbox One S. Na sua primeira entrevista como líder da divisão de gaming na Microsoft Portugal, Joana Barros diz para quem é afinal esta nova consola, explica porque acredita que o anúncio do Project Scorpio não vai fazer moça nas vendas atuais e ainda revela como é criar uma estratégia para a Xbox num país que é conhecido como ‘PlayStationlândia’.

A Microsoft Portugal definiu algum objetivo de venda para a Xbox One S?

Claro. Os nossos objetivos de vendas prendem-se um pouco com a nossa quota de mercado – e estes são dados confidenciais. Mas obviamente acreditamos que com a chegada de uma nova consola, de um novo modelo da Xbox One, que vamos crescer em vendas, pelo menos é isso que é esperado.

E principalmente também vamos continuar a apostar nos títulos aos quais nos associamos, não só dos estúdios Microsoft, mas também os nossos estúdios parceiros.

Sim, temos o objetivo de crescer em vendas.

Por falar em quota de mercado, em 2014 o diretor-geral da Microsoft Portugal, João Couto, disse que o objetivo para esta geração de consolas era chegar aos 15%. Estão longe, estão perto?

Não posso falar desses valores. Continua a ser um objetivo… nem diria um objetivo porque de facto estamos perto, mas não é um tema que se possa falar especificamente.

Voltando à Xbox One S. Os meios especializados internacionais que já analisaram a consola têm sido taxativos: dizem que se o utilizador não tiver um televisor 4K então não é uma compra aconselhável. Partilham dessa visão?

É de facto um dos pontos-chave desta consola, permitir a transmissão de conteúdos em 4K de parceiros como a Netflix, de discos Blu-RAy, o que quisermos. Normalmente quando se aconselha a utilização significa que queremos dar ao nosso consumidor a melhor experiência que conseguimos com a melhor consola que temos.

Esse é o conselho da utilização. Obviamente que não é por não haver um televisor 4K que não vale a pena comprar a consola. Acho que parte um pouco depois da decisão de quem a vai comprar.

Também por causa desta questão de ser direcionada para o 4K e de ter suporte para HDR, esta é uma consola de nicho ou continua a ser direcionada para uma venda mais massificada?

Na altura do lançamento houve muitos comentários sobre essa questão de ‘a Xbox já não é para hardcore gamers, queremos uma consola para toda a gente’.

A nossa aposta é cada vez mais numa consola versátil. Continuamos a ter uma série de funcionalidades que permitem a utilização por parte de toda a família. O próprio streaming para o computador Windows 10 caso o televisor da sala esteja a ser utilizada.

Continuamos a ter essas funcionalidades, no entanto o desenvolvimento do serviço Xbox Live também mudou um bocadinho no sentido de responder às necessidades dos gamers. Ou seja, queremos continuar com essa abordagem, mas aumentámos uma série de funcionalidades sociais, dos clubes dentro do Xbox Live, que permitem também uma maior aproximação aos hardcore gamers e a quem gosta realmente de jogar e não compra a consola para ser uma box de entretenimento.

Em Portugal está disponível a Xbox One S com 2 terabytes de armazenamento. Há outras duas versões, com 500GB e 1TB, que também vão chegar a Portugal. #Crédito: Future Behind

Por outro lado temos o suporte para videojogos HDR, mas os jogos HDR só vão chegar no final do ano. Isso pode adiar as vendas? Há filmes e séries, mas jogos ainda não estão disponíveis.

É verdade. No entanto continua a ser uma possibilidade que nós deixamos em aberto e de certa forma um incentivo aos estúdios para desenvolverem esse tipo de conteúdos e para melhorar sempre a experiência do consumidor.

Cá em Portugal têm aquele programa de apoio aos programadores e estúdios independentes…

Por acaso em Portugal funciona um pouco à parte, é um departamento à parte, não é o departamento Xbox que trata, é o DX – Developer Experience – e esse departamento tem uma proximidade muito forte com a comunidade de programadores em Portugal. Que não estão necessariamente a desenvolver para Xbox.

Ou seja, a ideia é criarmos uma relação muito próxima com esses game developers, para eles preferirem a nossa tecnologia. Depois é uma passagem natural. Sempre trabalharam com Microsoft, portanto o desenvolvimento natural para eles é continuarem a trabalhar em Windows e desenvolver para Xbox.

Ainda assim o programa oficial é o ID@Xbox e é um programa a nível internacional. Qualquer estúdio que queira produzir para Xbox tem que contactar esse departamento internacional da Microsoft.

… isto para perguntar se estão a falar e a estimular os programadores portugueses para de alguma forma tirarem partido das novas funcionalidades da consola?

Sim, não só jogos, como também em aplicações. Nós agora vamos ter uma atualização de software, portanto, cada vez mais apps que já estão no Windows vão passar a estar também na Xbox.

O que para nós é ótimo. Conseguimos enriquecer sempre a experiência, esse é sempre o último objetivo e o mais importante de todos.

Temos agora uma consola nova, mas a Microsoft também já anunciou uma futura consola [Project Scorpio]. Isso pode prejudicar o vosso posicionamento? Como explicam aos consumidores para comprarem a Xbox One S se para o ano já há outra consola?

Percebo a pergunta. O Project Scorpio é um projeto que nós próprios Microsoft, nós próprios equipas Xbox espalhadas pelos países, conhecemos na verdadeira essência juntamente com os consumidores na apresentação da E3. É uma máquina muito à frente de tudo aquilo que existe neste momento no mercado, que de facto nós próprios não podemos falar muito sobre ela, mas acreditamos que vai ser o próximo passo no futuro do gaming.

Se vale a pena comprar uma consola nova porque vai sair outra mais à frente… Quer dizer, é sempre esperado que saiam edições superiores à nossa. Quando estamos a comprar um dispositivo qualquer que seja… o mercado está a evoluir de tal forma rápido que corremos sempre esse risco.

Seja em consolas, no telefone… mais uma vez é a escolha do consumidor.

Nos smartphones isso já acontece. Mas nas consolas as pessoas ainda não estão habituadas, muito menos no espaço de ano e meio terem três consolas diferentes para escolher. Isto gera divisão, confusão e expectativas relativamente ao que aí vem.

É verdade. De certa forma ao aumentarmos a oferta, aumentamos também a diversidade, temos uma maior escolha para o consumidor. Na minha ótica é sempre melhor. Podes optar pela tua preferência: se a tua preferência é preço vais comprar a mais barata, se a tua preferência é novidade vais comprar o que acabou de sair.

Acho que não é porque vai sair uma consola no natal de 2017 que se vão perder vendas neste momento. Quem quer realmente comprar e quem está na ânsia de ter a novidade e de experimentar, acho que não vem influenciar a escolha.

Joana Barros revelou que os jogos Halo 5 e Forza 6 venderam bem, mas é Minecraft quem continua a ser o campeão de vendas, mês após mês. #Crédito: Future Behind

Em termos de perfil de consumidor, esta nova consola é para quem já tem uma Xbox One, é para tentar roubar utilizadores à PlayStation ou é para tentar ir buscar utilizadores que ainda estão com as consolas antigas?

Essa geração Xbox 360 continua sempre a ser um dos nossos alvos principais. Ainda temos uma grande base de Xbox 360 ativas em Portugal, portanto continua a ser um dos nossos objetivos principais.

A Xbox One S tem unidades limitadas não só para Portugal, mas para todos os mercados. Esta consola de 2TB acaba por ser para aqueles fãs que não conseguem mesmo esperar e querem mesmo ter a novidade. De facto é uma consola que por ser de 2TB e por ser edição de lançamento tem um preço um pouco mais elevado e é natural que seja para esse nicho.

Desta vez Portugal teve a consola no primeiro dia. Algum motivo que justifique esta aposta?

Sim. E aí acho que foi de facto a correção do erro ou a tentativa de correção do erro… erro se calhar é uma palavra muito forte, mas tentativa de correção da situação que aconteceu na altura do lançamento da Xbox One. Não é esperado que em próximos lançamentos Portugal tenha as consolas mais tarde, pelo menos esse será sempre o nosso objetivo: fazer com que o nosso Day One seja igual ao Day One dos EUA.

O que é que se passou com a primeira Xbox One? [A consola chegou a Portugal em setembro de 2014 e na altura Joana Barros não pertencia à divisão Xbox]

Vou falar apenas daquilo que sei. O plano era para lançarmos só em países com maior relevância, ou seja, mercados maiores, esse era o plano. Porque seria também a estratégia conhecida do que ia acontecer no resto do mercado, com as restantes plataformas, mas depois acabou por não acontecer. E Portugal por ser um mercado pequeno… Nós temos muitas dificuldades, precisamente por isso, não só em lançamentos, mas em conteúdos, na língua portuguesa – e estamos a falar não só da Xbox, mas toda a plataforma acaba por ser um bocadinho desafiante por sermos um mercado pequeno. Conseguirmos ser suficientemente relevantes para que tudo aconteça ao mesmo tempo e todos os lançamentos para a língua portuguesa e para Portugal.

Na altura acho que foi exatamente isso que aconteceu, simplesmente não era essa a estratégia, a estratégia era apenas lançar nos mercados mais relevantes, nos mercados maiores, mas não conseguimos fazer esse lançamento em Portugal. Acabamos por ser um bocadinho prejudicados.

Do ponto de vista do consumidor é difícil de justificar haver consolas em Espanha e não cá. A imagem que se passa para os consumidores é muito importante.

Claro que sim, tens toda a razão. Mas a ideia seria sempre ‘não queremos lançar um produto para o mercado que não esteja totalmente adaptado a esse mercado‘. Iriam acabar por acontecer críticas caso fosse lançado e não houvesse a língua portuguesa. Não concordas?

Entre lançar bem ou lançar mal, a estratégia foi lançar bem. Posso falar do pouco que sei, como sabes ainda não estava cá, mas do que eu entendo da estratégia da Microsoft e da equipa da Xbox a nível internacional foi isso que aconteceu.

É um elemento menos referido, mas o comando da Xbox One S foi ligeiramente redesenhado: o material de construção é mais texturizado para um maior conforto durante a jogabilidade. #Crédito: Future Behind

Não estava cá, mas certamente que ainda sentem algumas consequências dessa decisão. Nove meses depois da grande rival PlayStation 4 é complicado…

Sim, sim…

Como é que se recupera essa desvantagem?

Recupera-se tendo um alinhamento de jogos mais forte, recupera-se tendo uma consola que apesar de ser também para gamers, não é uma consola só para gamers e tens todas as outras vertentes sobre as que já falámos há pouco.

Recupera-se, mais tarde, através do nível de preço. O nosso price point tipicamente está abaixo da concorrência e conseguimos recuperar algumas vendas a partir daí – apesar de não ser esse o nosso objetivo e o nosso foco.

Como é que é liderar a divisão Xbox num país que é conhecido como ‘PlayStationlândia’?

É um grande desafio. Conseguir conquistar. Temos uma expressão engraçada na comunidade Xbox que é o Conquer Hearts and Minds – e conseguir conquistar corações num país em que se fala de consola quase igual a PlayStation é muito complicado.

Ainda assim é interessante sentir a aproximação do consumidor, do mercado. Sentir que há de facto comunidades muito aficionadas à marca, já desde a Xbox 360. Principalmente por causa dos títulos como o Gears of War, como o Halo. Acabam por juntar uma comunidade que também nos apoia e nos ajuda a crescer.

Acaba por ser engraçado conseguir isto respeitando a posição da PlayStation no mercado, é inegável, obviamente. Continuar a crescer é sempre…. Ou seja, ainda temos muito por onde desenvolver e muito por onde crescer e isso acaba por ser bom. Temos muito por fazer que ainda não foi feito e que nos pode levar a um crescimento significativo.

Como é que se roubam corações à concorrência?

É difícil. Era o que te estava a dizer. Tentar uma maior proximidade com a comunidade, tentar estratégias diferentes tanto no retalho como no online e cada vez mais o brick and mortar – as lojas físicas -, estão a perder relevância, principalmente no gaming estamos a sentir uma forte tendência da componente digital.

Conseguir influenciadores, youtubers envolvidos também na nossa missão, na nossa visão e naquilo que queremos mostrar. E continuar sempre a tentar. Obviamente não esquecendo tudo o que seja conteúdos, jogos, a melhor experiência dentro da consola, desenvolver sempre toda a experiência Xbox dentro da consola e agora cada vez mais integrado com o Windows 10 e o gaming no Windows 10. Que neste momento é uma das grandes vantagens face à PlayStation, face a toda concorrência – somos a única plataforma que permite e permitirá este cross-play e que acaba por aproximar se calhar jogadores de PC, que não são jogadores de consola, aproximar à nossa marca.

Vai permitir que ‘eu’, que nunca joguei consola, que sou apenas PC gamer, se calhar vou poder experimentar os títulos AAA no meu computador e vou poder jogar contra os meus amigos que jogam Xbox – e até agora não podia haver este tipo de relação.

Aí acho que vai ser uma mensagem muito forte para este Natal e para os próximos tempos, que nós temos e a concorrência não tem. Não só falando da Xbox, mas de toda a plataforma Windows.

Disse que querem estar mais próximos da comunidade. A PlayStation faz vários eventos em Portugal e a estratégia funciona bem.

Fizemos o lançamento do Halo e do Quantum Brake. Fazemos normalmente em títulos core, que são mesmo importantes para nós. Foi o caso do ano passado que pegámos no segundo semestre de 2015, o nosso lançamento principal foi Halo 5 e no primeiro semestre de 2016 Quantum Brake.

Nos dois fizemos um lançamento para os fãs em que fizemos passatempos, oferecemos exemplares dos jogos. Obviamente que esta estratégia e é essa a estratégia que a PlayStation faz, exige um investimento de marketing que nós não conseguimos acompanhar na totalidade.

E muitas vezes os nossos investimentos de marketing, se nos queremos focar na venda e se nos queremos focar no retalho, temos que fazer opções. Não que vamos priorizar unicamente o retalho, não é essa a mensagem que queremos passar. Ainda assim, os investimentos de marketing não chegam para todas as…

Não é a primeira vez que fico com a sensação de que estão de pés atados.

Não nos podemos esquecer que fazemos parte de uma organização internacional, que é a Microsoft, que tem a dimensão que tem. E obviamente que faz parte da nossa estratégia a nível nacional fazer crescer o negócio da Xbox e o negócio do gaming em Portugal. Ainda assim não diria que estamos de pés atados, mas temos as limitações inerentes ao facto de não sermos uma organização independente.

Não somos a Xbox unicamente, fazemos parte de uma organização superior. E temos de estar alinhados com a estratégia da empresa.

Para finalizar, uma questão que é com um tiro no escuro: podemos esperar algum dia a localização de jogos Xbox para Portugal?

É uma luta que temos, não diria diária, mas todos os anos. E à qual eu não posso dizer que sim, essa era a resposta que eu desejava. Mas estamos a trabalhar nesse sentido e é um projeto que queremos muito que avance.

Rui da Rocha Ferreira: Fã incondicional do Movimento 37 do AlphaGo.
Artigo sugerido